Hoje comecei a ensinar minha sobrinha a ler.
Tudo não passou de uma brincadeira, pedi que ela me mostrasse uns desenhos, peguei uma caneta azul e depois escrevi algumas palavras entre os traçados que ela havia feito com lápis de cor. Ela conversava como um foguete e eu anotava algumas das palavras que ela dizia.
Tudo não passou de uma brincadeira, pedi que ela me mostrasse uns desenhos, peguei uma caneta azul e depois escrevi algumas palavras entre os traçados que ela havia feito com lápis de cor. Ela conversava como um foguete e eu anotava algumas das palavras que ela dizia.
CAMINHA, MAMÃE, PAPAI, TIO, VOVÓ – foram as que ficaram escritas...
Mais tarde eu encontrei este papel novamente e ela reconheceu “mamãe” e “papai”. Me apontava com o dedo dizendo: mamãe tá desenhado aqui, tio!
Mais tarde eu encontrei este papel novamente e ela reconheceu “mamãe” e “papai”. Me apontava com o dedo dizendo: mamãe tá desenhado aqui, tio!
Minha irmã disse que queria que ela aprendesse a ler logo. A perguntei se ela mesma gosta de ler... Ela me olhou meio de lado e entendi a resposta, que me motivou a dizer que deve ser difícil a uma criança gostar de algo assim, sem ver que a própria mãe, o pai ou alguma criatura que passe instantes da sua vida saboreando palavras em livro, jornal ou outro lugar.
Não tive como não pensar nas escolas e em tantas crianças que não aprendem a ler, ainda que tantos educadores, secretários, ministros, supervisores, queiram muito que isto aconteça. Mas se aprendemos porque somos despertos, encantados, porque desejamos ou nos apaixonamos, onde estas tantas crianças podem ver no mundo as pessoas (inclusive seus educadores) se relacionando com a indescritível experiência da leitura? Não contam as experiências dirigidas a cumprir tabela.
Não é pedir demais que um fulano aprenda aquilo que eu peço com palavras, mas que de fato na minha vida tem uma importância meramente funcional?
Nisto mora uma esperteza destas crianças. Elas ouvem palavras que pedem “leiam! escrevam! copiem!”, mas como elas percebem além das palavras que ouvem, atendem assim aos pedidos que fazemos e ficam escondidos atrás do que dizemos. Elas são sábias na compreensão de que muitas vezes dizemos uma coisa desejando outra.
Esta sabedoria é um ímpeto que os filósofos preservam ou resgatam na travessia da vida inteira. Vivem em busca da percepção além do óbvio, querem devassar, encontrar além da primeira vista, não se aprisionar na casca.
É desesperador constatar o atendimento a tantas demandas desta campanha para alfabetizar a qualquer custo – planilhas classificatórias, competições para as melhores notas em avaliações nacionais (que garantem o aumento do lucro de muitos). Mas o coração lá quer atender às demandas de planilhas e competições?
Ele quer mais é saber que a Mamãe e o Papai, além de pessoas queridas, também podem ser reinventados com papel e caneta azul. E ficarem lá, desenhados por muito tempo... sempre que olhados, evocando sabe-se lá que memórias e sentimentos.