sexta-feira, 13 de maio de 2011

Água dos Olhos


            “Chora, disfarça e chora...”, canta Cartola esta que entre tantas outras de suas canções tem o chororô e o lamento como indispensáveis. Imagino que estes sambistas não deviam ter a menor vergonha de chorar!
            É lamentável a cultuação que o nosso tempo faz a um riso fabricado, que temos a impressão de podermos comprá-lo com a maior facilidade. As novelas, os out-doors e este tanto de livros “que ensinam a viver”, querem despejar-nos uma idéia de vida barata e alegria a qualquer custo. Não a alegria como potência de vida, como fio condutor que nos anima , mas uma alegria superficial e que não se sustenta ao apagar das luzes.
            Pasteurizados, politicamente corretos, auto-sustentáveis, inclusivos ao extremo e rindo o dia inteiro (sem rugas, de preferência). Dá mesmo uma vontade de evocar Nelson Cavaquinho e destilarmos por aí um mantra seu: “tire seu sorriso do caminho... que eu quero passar com a minha dor...”.
            A alma não atende as demandas colocadas ao Homem Bem-Sucedido deste tempo. Na contramão deste marketing da felicidade de boutique, ela nos cobra o reverso da moeda, o choro estacado, o grito abafado, a lágrima que não rola sob ameaça de uma consciência correta. Adoecemos nesta unilateralidade disfarçada.
            A alma não atende porque sabe que somos escuro e claridade e é só no movimento gerado por contradições é que há vida. É neste movimento  que situamos a possibilidade de escorregarmos da linha da mediocridade, do horizonte aceito, da vida culturalmente almejada. Daí, conscientes e alertas a este lugar mediano, contemplamos e vivenciamos os campos abaixo e acima desta linha. Encontramos o abismo e o céu, o choro e o riso, a água e o fogo, Oxum e Iansã, os dois hemisférios da Terra. Olhamos a importância dos Devaneios sem nos esquecermos do Rigor. Sábios os gregos que tinham em Dioniso toda a manifestação do gozo, da festa e do outro lado a disciplina de um Apolo.
            É como algo que sempre ouço o Ilo dizer: andarmos pela vida acompanhados/guiados pelo velho e a criança – pacientes e novidadeiros. Eis o desafio!

          



Filipeta do espetáculo "Os que riem e os que choram" - texto e direção de Ilo Krugli - Teatro Ventoforte - 2010


          

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