terça-feira, 28 de junho de 2011

Lúdico Muro da Memória

No sábado e no domingo a estréia do Lúdico Circo da Memória, no Teatro Polytheama de Jundiaí...
Na segunda-feira que precede, as oito ou nove horas que separam São Paulo de Palmeira d’Oeste, onde fui parido. Passada a hora de rever a avó, o tio, os amigos mais que alguns parentes que não tenho saudade alguma e nem faço questão de rever.
Idas e vindas entre Palmeira d’Oeste, Jales e Urânia. Entre abraços de queridos, revi a Maria Eduarda, filha da minha grande amiga, já moça e descobri que virei ilustração no livro que meu querido eterno professor deverá lançar. Ele me ilustrou e ao lado colocou um poema muito bonito falando de arte, praças, Baco.
Por fim, me despeço de Palmeira esperando o ônibus para ir até Jales e de lá, para Sampa. O ponto para esperar, de frente a um terreno sem casa cercado por um muro cinza. Lugar onde existiu a casa de taboa que minha bisavó morou e que por tantas e tantas vezes passou horas me deixando ser sua companhia.
Não preciso nem dizer que a espera é um desfilar de personagens e cenas. Um verdadeiro Lúdico Muro da Memória puxado pela imagem forte da minha bisa subindo a rua portando seu guarda-chuva preto (as mulheres lá ainda usam muito guarda-chuva para se protegerem do sol forte). Ela vem com aqueles óculos de grau e de sol ao mesmo tempo, com a saia amarela e blusa branca. Seu aspecto é sempre de uma seriedade respeitável, mesmo quando ela sorri...
Paisagem sonora de latidos, carro de som anunciando a nova morte da cidade (sempre com a Marcha Fúnebre ao fundo... ai que medo quando era na noite que isto se ouvia...). De dia tudo bem! Quando não estava brincando, passava horas ao lado da bisa Celina vendo-a lavar roupa numa taboa e uma caixa de cimento, chamava-se vasca aquele tanque e na maioria das vezes, a bisa colhia do pé um mamãe, cortava, espalhava açúcar e me dava pra comer enquanto terminava de lavar a roupa.
Quanta saudade! E se a memória é sempre lúdica, por mais vezes quero estar neste ponto de ônibus reinventando ao passo que recordo estes momentos com cheiro de mamão e de casa de madeira. 

                                    Foto de Simone Lins
                                            Foto de Simone Lins

Foto de Simone Lins









                                                                                 Foto de Simone Lins

foto de José Aparecido dos Santos

domingo, 12 de junho de 2011

REFLEXÕES SOBRE A PERSONAGEM

Dois rios que entram em confluência: um, das águas/imagens de dentro: sonhos, memórias; outro, que é carne, músculo, osso.
A personagem é este encontro das águas palpáveis e impalpáveis. Monumento efêmero esculpido pelo labor de tantos trabalhadores... ou um só. Traz consigo e com seu universo materializado nas volúpias derradeiras chamadas cenas, o suor do que escreveu, do que dirigiu, do que preparou corpo, voz, pensamento, do que desenhou figurinos, do que reinventou a existência do espaço.
Quando existe, puxa um fio cuja ponta primeira deve morar nos primeiros intentos desta espécie em saborear e provocar e alegrar a espiritualidade de uma comunidade.
Fez e faz isto vestindo ou não máscaras. Com palavras, ou sem elas. Ardendo em paixões ou ridículo na corda bamba que desobedece a moral.
Performer? Brincante? Persona? Em bando? Solitário?
Seu lugar é a urgência de um encontro utópico em querer ser inesquecível. Ir repetível. Por isto é sempre uma aparição ousada, ainda que sutil, delicada.
É obra gestada no cultivo de um ofício fundamentado pela liberdade e paixão. Se atende a demandas do capital, da catequese, da pretensão em ensinar, perde radicalmente um dos seus ingredientes do qual sua existência é feita.
Não sei o nome deste ingrediente. Desconfio que é o mesmo que tempera a vocação dos poetas quando criam, dos filósofos quando se indignam e das crianças quando brincam.

Ilo Krugli em cena do espetáculo "Um rio que vem de longe"